No
mitologia antiga era comum a adoração a entidades duais – meio isso e meio
aquilo, como o leão com cabeça de serpente, o homem com cabeça (e rabo) de
touro (o minotauro), os meio-homens e meio-cavalos (os centauros) e outras
esquisitices semelhantes.
Como
brasileiro não se dá por achado e não fica devendo nada a ninguém, não podíamos
ficar sem um desses seres ambivalentes (nem sempre tão valentes assim). E apareceu um, meio bovino e meio leporídeo (para
quem gazeteou as aulas de ciências, os leporídeos são a família das lebres – e
dos coelhos também). Portanto, o nosso ser mitológico seria um cruzamento de
boi com coelho. Mais precisamente, um filhote de boi, um bezerro. Como macho
com macho não se criam nem procriam, vamos mudar de bezerro para bezerra. Assim
fica melhor: da união dos dois opostos, masculino e feminino, surge a síntese,
o produto mitológico. Misto de um coelho com uma bezerra. Perfeito para os
padrões da mitologia. Bezerra com coelho, um bezelho. Mas, como respeito é bom
e cabe em qualquer lugar (proíbo piadinhas!), vamos escrever o nome com inicial
maiúscula. Afinal, trata-se de um ser importante. Então tá: Bezelho!
Como
é praxe acontecer com todos os seres especiais, o Bezelho nosso precisaria ser
integrado à história e, assim, foi entronizado num tal de Ministério da
Integração Nacional, onde poderia se desenvolver eficaz e confortavelmente,
exercendo a função vital peculiar aos bovinos jovens, a de mamar nas tetas da
vaca-mãe. No caso, as tetas são amplas e fartas e atendem pelo estranho nome de
erário público (a redundância é
proposital).
A
dualidade do nosso Bezelho não fica só na sua estrutura constitutiva,
espalha-se ainda pelas suas incursões às tetas, isto é, às verbas: na sua terra
de origem comprou duas vezes um mesmo terreno (placidamente como um bovino, e
ligeiramente como um leporídeo). Com dinheiro público, claro, que Bezelho é
Bezelho e não Burrelho. E também nomeou dois parentes para cargos públicos (por
onde anda a Lei do Nepotismo?)

Na
semana passada, ao se explicar no Congresso Nacional, esperto como coelho e
diante de um reduzido número de parlamentares (os exaustos congressistas estão
a gozar de merecidas férias), o Bezelho disse que as acusações são manobras
políticas que visam prejudicar o seu partido. O partido dele é o PSB, mas ele
foi formado nas equipes de base do PDS (aquele da sustentação da ditadura
militar). Se a política brasileira fosse um assunto sério seria o caso de
perguntar: o que tem a ver uma camarilha ideologicamente vinculada à direita
reacionária – como o extinto PDS – com o atual repositório das artimanhas
bezelhinas, o PSB – um partido de esquerda, socialista até no nome? Não é
preciso responder, dá para entender: para se manter agarrado às tetas, não
importa o chão em que se pisa, nem o teto sob o qual se abriga e nem a cor da
camisa que se veste. Afinal, que mal há em se aprender a cantar o hino nacional
dos Países Baixos se a vaca for holandesa, não é mesmo?
No
Congresso Nacional, o Bezelho foi bovinamente aplaudido. Pudera: na plateia só
estavam as vaquinhas de presépio.
Crédito fotográfico: Brasil Escola (http://www.brasilescola.com/brasil/a-seca-no-nordeste.htm)
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